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quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

Dos dias em que o vento nos afasta do mar - 11º sopro: Cruzília, os cavalos e os jogos contidos em seus negócios

Olá!


Quando pensei em ir a São Thomé das Letras, estando hospedado em Caxambu, comecei a procurar os melhores caminhos, conforme expliquei no texto citado. Uma das vias possíveis empurrava-me mais a leste, de forma a cruzar duas cidades antes de chegar ao meu pretendido destino. Uma delas não fazia parte do meu roteiro mental, mas como houve algo que me chamou a atenção nela, fiz sua adição ao meu circuito. Trata-se da cidade de Cruzília.


Esse nome, evidentemente, significa Terra da Cruz, mas não deriva simplesmente do sentimento religioso. O lugarejo que lhe deu origem era o cruzamento de duas estradas que levavam à região de extração de ouro em Minas Gerais, e, por isso mesmo, era conhecido como Encruzilhada. Acho que para dar uma aliviada na perspectiva umbandista do termo, foi acrescentado o nome do padroeiro do local à sua frente, e passamos a ter São Sebastião da Encruzilhada, até chegar ao nome hodierno, em sua emancipação municipal. Mas o padroeiro ficou, e é o patrono da cidade e da igreja matriz.


Sebastião, aliás, foi um daqueles mártires dos primeiros tempos do Cristianismo, que costuma ser representado em seu momento de condenação. O sincretismo com a Umbanda associou-o com uma divindade própria: Oxóssi, orixá da caça. Como é o padroeiro da cidade do Rio de Janeiro, é um santo dos mais conhecidos no Brasil.


Sua reverência não para por aí. Na entrada da cidade, há uma imagem do santo abençoando os transeuntes ainda na estrada, e há uma série de referências no comércio local e em outros estabelecimentos, como esta escola, com prédio antigo e muito bonito.


A igreja matriz tem outros qualificativos. Ela é um santuário, que, na estrutura católica, significa se tratar de igreja destino de peregrinações, especialmente no caso em que possua algum tipo de objeto sagrado, como uma imagem ou relíquia. No caso, temos a cruz que fica no mirante da serra, e uma erigida bem na frente da igreja. É o Santuário da Santa Cruz.


O interior da igreja é fartamente decorado, com o estilo colonial típico destas cidades do interior. Chamou-me a atenção uma decoração especial feita ao redor do ambão, com jarros de argila, flores e tecidos, além dos detalhes do móvel em si.


O culto ao Padre Vitor e a Nhá Chica se estende por aqui, como por toda região. No próximo texto, finalmente vou me aprofundar um pouco mais na história de ambos, de como se originaram e persistem seus cultos até os dias de hoje. Desculpem pela foto com qualidade vergonhosa.


Do lado de fora da igreja, a tradicional praça, com o tradicional coreto, com a tradicional calma e com a tradicional limpeza, no topo de um morro que impera sobre as casinhas das ruas adjacentes.


Na parte de trás da mesma igreja, há uma outra praça, dedicada ao monsenhor João Câncio, primeiro padre daquele distrito, que se encarregou de cuidar não somente da parte espiritual, mas da educação do lugar, ao fundar sua primeira escola. Há um busto em sua homenagem, que está merecendo uma reforminha.


Cruzília é conhecida pela alta qualidade dos queijos que produz. Um deles, inclusive, foi classificado em quarto lugar em uma seleção dos melhores queijos do mundo. Seu empório é o local onde se vende tal acepipe, mas há vários outros produtores espalhados pela zona rural do município.


A bem dizer da verdade, o queijo é verdadeiramente sensacional, com um preço até que razoável, dada sua fama, e com uma variedade bastante farta. Mas há um probleminha: como queijo é uma coisa naturalmente onerosa, mesmo que não se pratiquem preços abusivos, é necessário que o comprador tenha critério. Somos um país pobre, infelizmente é isso. Dessa forma, sugerimos que os vendeiros não se aborreçam quando pedirmos uma prova. São limitações do orçamento, e não uma mera sanha em se aproveitar para provar de tudo e forrar o bucho.


Mas não há dúvida que o mais pitoresco que existe na cidade é o seu Museu do Mangalarga Marchador. É um lugar único, que se dedica a contar a história e de demonstrar como é essa raça de cavalos desenvolvida no Brasil, mais especificamente nesta região de Minas Gerias.


A casa em si já é um atrativo a parte. Era sede da Fazenda Bela Cruz, e é uma daquelas grandes construções que os fazendeiros mais endinheirados costumavam levantar para passar seus dias nas zonas urbanas próximas às suas terras, onde podiam fazer seus negócios mais confortavelmente. O edifício é construído na base mais comum à época: taipa de pilão, uma espécie de mistura de barro batido com substâncias aglutinantes, como a gordura. Moldava-se rigidamente às armações de madeira das paredes, formando uma estrutura bastante sólida, ainda que muito sujeita à umidade.


A casa em questão era pertencente a Gabriel Francisco Junqueira, mais conhecido como Barão de Alfenas, que tem o mérito de ter desenvolvido essa nova raça de cavalos, o Mangalarga Marchador, que dá nome ao espaço. Além disso, foi influente figura política dos tempos do império e proprietário de muitas, mas muitas posses.


O museu é dividido em duas partes. No andar inferior, temos um espaço destinado a exposições temporárias, chamado Espaço Cultural Beija-Flor.


Neste local, são realizados saraus, apresentações musicais, palestras e mostras temáticas. Na ocasião de nossa visita, tínhamos a exposição “Memórias da Casa Bela Cruz e Fazendas Tradicionais”.


Trata-se de uma ampla gama de objetos, utensílios domésticos diversos, artigos de uso pessoal e fotografias distribuídos pelo porão de forma a dar coerência nos seus contextos de utilização.


A ideia é retratar um conceito de época, fazendo o transporte histórico aos tempos em que casas como essa ainda eram residência dos proprietários de terra, do modo como viviam, como recebiam suas visitas, como se alimentavam e se levavam momentos de lazer.


Já o andar de cima é dedicado propriamente ao cavalo e a tudo o que o cerca. Há vídeos e painéis que explicam sua origem e padrões. Devido ao relevo da região, achou-se necessário produzir um cavalo veloz para o galope sem perder um mínimo de comodidade. Um cavalo rápido, mas desconfortável, acabaria com a espinha de qualquer peão; e um cavalo cômodo, mas lento, levaria qualquer viagem por esse jardim de morros ao infinito e além, interminavelmente.


O museu, além do cavalo em si, expõe um acervo considerável de equipamentos destinados à montaria e ao trabalho de campo, como estribos, rédeas, freios, bridões e selas.


E também são exibidas rouparias típicas dos peões que precisavam atravessar estradas e matagais, com a preponderância de artigos de couro cru. Com o calor que fazia naquela manhã de setembro, eu passava mal só de ver aquele montante de peças grossas, pesadas e impermeáveis.


Renilda e Luana são os nomes das guias do museu, tão simpáticas e receptivas como é a própria instituição (ABCCMM – Associação Brasileira dos Criadores do Cavalo Mangalarga Marchador), mantida pela associação de criadores da espécie-tema. Um belo cafezinho com bolachas para fechar a visita.


Como eu já devo ter falado neste blog, sou um ser eminentemente urbano. Nasci na Mooca, cresci na Vila Ema, casei no Parque São Lucas, tive filhos no Jardim Elba e hoje moro na Sé, tudo na cidade de São Paulo, o maior conglomerado urbano desta Latinoamérica. Meu contato com as zonas rurais se limita aos meus parentes do Paraná e, embora não seja exatamente um nó cego nessas coisas do interior*, há certas lógicas que me são estranhas. Uma delas é o uso comum de leilões. Na cidade, leilão é uma coisa do imaginário ou do judiciário. Este último para, principalmente, quitar dívidas dos tristes insolventes, e o outro vindo das comédias de erros, onde um idiota qualquer compra involuntariamente algo aparentemente inútil. O roteiro geralmente se fecha com a tranqueira se revelando valiosa, depois de causar um monte de percalços ao seu abobado comprador. Mas no campo a prática é muito mais frequente, inclusive para comerciar o tal do cavalo Mangalarga Marchador.
Assisti uma vez a um leilão beneficente em Paraibuna, mas que, justamente pelo seu caráter caritativo, serve unicamente como amostra do que são os leilões de gente grande. A coisa é cercada de uma aura de combate, como se os contendores calçassem luvas de boxe. E isso tudo me fez pensar na Teoria dos Jogos, que estuda as estratégias e comportamentos das partes envolvidas para obter os melhores retornos possíveis, e que anda muito em voga nesses tempos de empreendedorismo e autoajuda.

Falando francamente, por mais que eu estude a tal teoria, não consigo me convencer da plenitude de sua validade, principalmente pelo seu uso profuso por aquela galera que gosta de jogar ciência no seu discurso como forma de convencer uma incauta audiência do mundo empresarial (aqui tem um bom exemplo), mas ela não me parece plenamente nula de valor, muito pelo contrário. É que talvez eu não manje tanto de Economia quanto deveria. Mas sigamos.

Para entendê-la, é preciso fazer alguns ajustes. Em primeiro lugar, o nome “Teoria dos Jogos” pode dar uma impressão de fundo lúdico, já que seu termo raiz, o latino jocus, significa zombaria, troça, escarnecimento, brincadeira, de onde vem a palavra “jocoso” e o termo inglês joker, que significa palhaço. Mas a teoria, em tese, cuida de coisas sérias, então é melhor pensar em termos mais duros, como certame ou disputa, que fazem pensar em confronto entre adversários.

Outra coisa é ter o cuidado de ter em mente que o valor preditivo da Teoria dos Jogos é zero, o que faz com que o próprio termo “teoria” seja impróprio (teoria, no sentido científico, tem o caráter que esmiucei neste texto). Seus defensores alegam que seu valor mais autêntico está na capacidade de gerar escopos de possibilidades, e não prognósticos, e aceitarei tal alegação, para o bem da concisão deste texto.

Feitas estas considerações, vamos ao cerne, como o faminto avança ao prato de comida. A Teoria dos Jogos tenta aplicar um modelo matemático às circunstâncias em que há uma disputa onde não há certeza de que será possível adotar estratégias colaborativas entre seus partícipes, mormente aplicáveis a questões econômicas e de negócios, mas também atribuíveis a outros campos. Com isso, a aplicação séria desta teoria visa fornecer os elementos estruturais de uma determinada relação competitiva. A Teoria dos Jogos pela via da autoajuda, por outro lado, tenta convencer o contendor de que lhe podem ser providas ferramentas para vencer qualquer tipo de embate financeiro. Deu para perceber a diferença de propósitos? Esse último tipo de baboseira, nós vamos deixar de lado.

Seguindo. Seres humanos, diferentemente do que ocorre com ursos ou toupeiras, gostam de viver em comunidade, e, se são assim, estabelecem relações que obrigatoriamente possuem interatividade (porque de nada adianta viver conjuntamente sem alguma forma de comunicação) e interdependência (onde cada um dos membros desempenha um papel necessário, que traz proveito para si e para os demais). Essa teia de relações, vistas como um todo, parecem funcionar bem, haja vista à própria existência da comunidade. No entanto, quando descemos aos subgrupos ou às individualidades, há situações de desequilíbrio, e não estou falando aqui de mazelas sociais, mas de um ganha-perde relativamente normal, até mesmo esperado. Todas as relações humanas envolvem algumas flutuações, onde, por exemplo, um lado cede e outro se beneficia; talvez o movimento se reverta em uma próxima ocasião. Isso significa que as interações, sejam no foro íntimo, sejam no mundo dos negócios, envolvem estratégia de ação. Por exemplo: há dois jogos no final de semana no mesmo horário – um do Juventus, outro da Portuguesa. Eu quero ir ao primeiro, a patroa ao dos patrícios. Para não colidir, podemos chegar a um acordo. Vamos no do Juventus esta semana, e na Lusa no domingo seguinte. Isso parece OK, mas pode haver algumas táticas por trás disso. A cara-metade cede hoje, sabendo que o jogo vindouro tem mais importância para o campeonato; eu faço questão hoje, tendo em mente que há previsão de chuva para a próxima rodada. E, assim, cada um de nós segue um tipo de decisão mais ou menos raciocinado. Isso é o que se pensa quando se fala em “jogo” na teoria ora analisada. Colocamos na mesa as hipóteses viáveis para a resolução de um determinado conflito e sopesamos cada uma delas, da melhor maneira possível. Para ambos? Nem sempre. Se sim, ou seja, quando ambos ganham e trabalham para isso, temos uma interatividade cooperativa. Mas há situações onde, para alguém ganhar, é preciso que outro perca. E por isso é que temos a disputa, a interação competitiva.

O que a Teoria dos Jogos preconiza é que essas estratégias podem ser reduzidas a esquemas, portanto. E, uma vez esquematizadas, as interações passam a oferecer um desenho lógico, de modo a se explicitar os rumos que estão tomando e para onde podem ser desviadas. E aqui a comparação com os jogos torna essa capacidade de se desenhar a lógica das situações um pouco mais fácil de entender. Vamos pegar o futebol de novo. Nele, você sabe exatamente quem são os disputantes, há um conjunto de regras bem determinado, há uma certa quantidade de informações sobre o que se disputa e o que é preciso fazer para se obter resultados positivos. Os envolvidos na disputa são os jogadores: onze para cada lado, com direito a três substituições e orientação de uma comissão técnica. As regras são aquelas famosas dezessete, que envolvem campo, bola, árbitros, duração da partida, faltas, impedimento, córner e etc. As informações dizem respeito ao que a partida vale: um campeonato e o quanto ele paga, um torneio amistoso, uma pelada de solteiros versus casados. E vencer ou perder depende de gols, esse é o meio que se tem para preponderar sobre o contendor. Em resumo, temos o quem, o como, o porquê e o para quê. De um modo tosco e sem considerar diferenças de placar, podemos correlacionar todas essas situações da seguinte forma:


Desta forma, podemos delinear graficamente as situações possíveis de uma partida entre os tradicionais times desta capital das terras de Piratininga. Cada quadradinho representa um placar possível, sendo que, quando os dois resultados são iguais, temos um empate. Do contrário, há um vencedor e um perdedor. Com isso, estão esquematizadas as possibilidades em uma matriz dois por dois e finito. Cada um dos quadradinhos é o que se chama de pay-off, que nada mais é do que um dos resultados possíveis, ou seja, o que cada um dos contendores paga ou recebe pela concretização de uma das hipóteses. No primeiro pay-off, a Portuguesa faz um gol e o Juventus toma um gol (isso é chamado de jogo de soma zero, que ocorre quando uma circunstância positiva para um player é obrigatoriamente negativa para o outro), e a Lusinha tão gloriosa outrora vence o embate. Temos dois pay-offs que preveem empates e um outro ainda que indica vitória do Moleque Travesso. Mas isso é só um exemplinho boçal. A coisa é muito mais profunda, e tem muito a ver com a incapacidade de se prever o que o pessoal do lado de lá vai fazer. E isso fica claro no problema mais clássico da Teoria dos Jogos: o Dilema do Prisioneiro. Seu enunciado:

Sejam dois meliantes que foram pegos com a boca na botija na cena de um crime qualquer, mas sem que se possa determinar com exatidão qual deles realizou a ação. Para tentar elucidar o delito, a polícia prende ambos em celas separadas e faz a cada um a seguinte oferta: se você acusar seu companheiro pelo crime e ele se calar, você será libertado e o infeliz ficará preso por dez anos. Se ambos ficarem quietos, a condenação será de um ano para cada um. E, se ambos acusarem-se mutuamente, a pena ficará em cinco anos.

Esquematicamente, teremos o seguinte (os números referem-se ao tempo de pena):


Vejamos o que há de características no problema. Como a decisão de cada um dos prisioneiros será simultânea e desconhecida para o outro, a estratégia a ser adotada deverá levar em consideração uma das duas seguintes opções: sendo certo que o ideal é ficar preso pelo menor tempo possível, melhor seria delatar e concorrer a uma pena zero ou silenciar e arriscar a pegar a pena mais leve, de um ano? Neste caso, é preciso procurar os pontos de equilíbrio do sistema, e, em um caso simples como esse, eles são dois.

Um deles é o Ótimo de Pareto, de quem já falei em um antigo post sobre a cidade de Arapeí. Seu princípio básico é a chegada em um ponto onde não há para onde se mover sem que se prejudique a posição de outrem. Em outras palavras, é aquele famoso caso em que um governo afirma não poder gastar mais em educação sem tirar dinheiro da saúde; se o fizer, haverá prejuízo nas filas de hospital, ainda que as mesmas diminuam nas creches. Como já falei sobre o tema, não vou me aprofundar. Na matriz, o ótimo de Pareto é representado pelo silêncio mútuo: não há como ser melhor para a situação de ambos conjuntamente, bastando somar as penas conjuntas das quatro situações, que, no caso, é igual a dois. Nenhuma outra situação proporcionará menos tempo de cadeia, mesmo que um dos prisioneiros fique livre.

O outro é o chamado equilíbrio de Nash, em referência ao matemático e economista John Nash, cuja epopeia de vida foi romanceada no filme Uma Mente Brilhante. Nash não foi o criador da Teoria dos Jogos (John Von Neumann, o criador do computador moderno, é quem primeiro sistematizou esquemas de estratégia de decisão), mas a aperfeiçoou ao ponto de ser laureado pela Academia Sueca pelo seu feito. Ele observou que, aparentemente, os oponentes em um sistema tenderiam a optar pelo melhor pay-off possível. No caso do Dilema do Prisioneiro, sem dúvida, seria delatar o rival, pois só assim seria possível conseguir a liberdade. Isso é o que se chama de estratégia dominante. Mas a adoção da estratégia dominante por todos os contendores encaminha a solução para fora da intenção de cada um, porque não há como ter dois vencedores em jogos não-cooperativos, assim como não dá para saber o que se passa na cabeça dos demais, e chegamos a uma situação de equilíbrio diferente do ótimo de Pareto. Aqui, não temos a melhor solução possível, mas uma situação em que nada mais pode ser feito no embate para que a situação dos adversários se modifique. Voltando ao Dilema do Prisioneiro, teremos que ambos os safardanas, optando pela estratégia dominante, alcaguetarão seu êmulo, na esperança de saírem livres. Mas o resultado será a condenação de ambos por cinco anos, pena para o mútuo dedo de seta. E esta se torna uma situação de equilíbrio, porque, considerando que o Prisioneiro 1 tenha delatado o prisioneiro 2, nada pode este fazer de melhor a não ser delatá-lo também. Ser delatado já faz com que cinco anos seja a pena mínima, com o risco de pegar dez, caso mantenha-se a quietude. Ser delatado significa impossibilitar a liberdade e a leve pena de um ano. Essa situação é o tal de Equilíbrio de Nash, e é o segundo ponto de equilíbrio de um jogo em que a colaboração não é viável.

No filme mencionado, há mais um bom exemplo de como Nash encara a Teoria dos Jogos e como chega ao seu equilíbrio, na guerra de conquista da loira linda. Outro filme que demonstra claramente o uso da Teoria dos Jogos, ainda que não a mencione explicitamente, é Jogos de Guerra, que assisti em seu lançamento no Brasil, algo raro na minha história. Ali, o peso maior está em decidir se vale a pena ou não atirar a primeira pedra. No caso, a pedra é um míssil nuclear. Vou recomendá-los mais abaixo.

E isso tem tudo a ver com os leilões de cavalos, que, como já comentei, é um dos principais meios com os quais o pessoal das coudelarias comercia seus simpáticos bichinhos. Quando estamos colocados para um leilão, é perfeitamente possível esquadrinhar, ainda que mentalmente, um diagrama de jogos, que seria tão mais complexo quanto maior for a quantidade de concorrentes. Os concorrentes presentes possuem estratégias que são, ao mesmo tempo, sucessivas e simultâneas. Quando um determinado lance é dado para um animal, já temos a concretização de uma estratégia. A decisão dos demais contendores em suplantá-lo ou não é outra, e assim sucessivamente, até o arremate final. Tudo é estratégico dentro do certame: reservar fundos para um cavalo específico, espalhar lances em diversas rodadas para valorizar os lotes, tentar fazer alguns dos itens fracassar para reduzir os preços globais, vistoriar os semoventes, fazer lances às cegas confiando no leiloeiro, arrematar lotes mistos para aproveitar as peças melhores. Isso faz com que as variáveis dos pay-offs sejam muito mais numerosas, e a matriz de cada um desses jogos fica muito mais múltipla do que o inocente esquema do Dilema do Prisioneiro. A imprevisibilidade das decisões faz com que, na minha humilde opinião, um leilão de cavalos se aproxime muito mais da não-linearidade dos sistemas da Teoria do Caos (veja aqui) do que da matematização proporcionada pela Teoria dos Jogos, e acho que é isso que me faz resistente, mas Matemática e Economia não são minhas áreas, por isso não fecharei vereditos. Prefiro me restringir aos parâmetros estéticos dos cavalos e da casa que abriga sua história, visita tão inesperada e agradável quanto a pequena cidade que os abriga.

Recomendações:

O livro abaixo é usado academicamente por contar com muitos exemplos de jogos com visão econômica:

BIERMAN, H. Scott; FERNANDES, Luis. Teoria dos Jogos. Campinas: Pearson, 2011.

Como eu disse, há um filme que contém uma biografia romanceada sobre John Nash. Sendo uma peça de livre autoria, é preciso ter certas reservas, mas Nash tinha mesmo alguns problemas, como a esquizofrenia. De qualquer forma, é um bom filme, mesmo que fosse de ficção.

HOWARD, Ron. Uma Mente Brilhante. Filme. Universal Pictures, 2001. Cor. 134 min.

E o outro filme citado, que parece uma aventurinha da Sessão da Tarde, mas não é. Em uma época de plena Guerra Fria, ver como era fácil uma potência disparar um saco de ogivas na cabeça da outra (com a reação óbvia) era assustador.

BADHAM, John. Jogos de Guerra. Filme. United Artists, 1983. Cor. 114 min.

* Bastando lembrar que, quando eu era um alegre petiz, a área onde hoje fica a Anhaia Melo era composta de chácaras de fora a fora, e eu era uma espécie de estafeta da casa, inclusive para comprar legumes e verduras, o que me fazia frequentar aquela mancha rural em plena cidade frequentemente.

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