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quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Sobre motivos para apoiar ou condenar a descriminalização do aborto

Olá!

Nada mais adequado que um hospital para refletir sobre questões de saúde. E é exatamente onde estou agora... Entra gente de maca, sai gente de muleta, entra ambulância, sai ambulância, entra criança, sai velho, todos pacientes impacientes. Bom, espero que no final todos tenham finais felizes prá contar.
Andemos. As recentes manifestações que se espalharam que nem fofoca das traquinagens dos namorados atrás dos muros, e das quais produzi meus habituais pitacos neste post, acabaram por ampliar muito a pauta de reivindicações da juventude. Nestes protestos, que se iniciaram com a grita pelo aumento da tarifa de ônibus, acabou se tratando de tudo um pouco, como a derrubada PEC 37, a má condição de trabalho dos professores, a corrupção dos políticos, os gastos exorbitantes com a Copa do Mundo, a baixa qualidade dos serviços oferecidos pela saúde pública e uma questão correlata: a defesa ao direito ao aborto. Tema polêmico.


Já que o assunto costuma gerar verdadeiras guerrilhas entre defensores e opositores da ideia, vamos fazer uma pequena delimitação de território para facilitar o desenvolvimento do texto. A massa jurídica brasileira já prevê três situações em que o aborto pode ser permitido: a gravidez resultante de estupro, a gravidez que traz riscos à vida da mãe e a gravidez de fetos anencéfalos – crianças que foram geradas sem que o cérebro se desenvolvesse. As duas primeiras hipóteses são fixadas em lei, enquanto a terceira deriva da aplicação de jurisprudência consagrada nos Tribunais. Portanto, não estarei aqui preocupado com estas situações, já que a demanda de parte da população é por um direito mais amplo e menos ligado a situações extremas, como estas citadas. Também não vou discutir o recente projeto de Estatuto do Nascituro. Sou contrário a praticamente todos os estatutos.

Pois muito bem, então. A premissa básica para se defender o direito ao aborto é baseada na afirmação de que ninguém é verdadeiramente favorável ao aborto em si. O que se tem é que o aborto é considerado crime, e, como tal, não pode ser objeto de políticas públicas de saúde, ao menos legalmente. Também temos a questão de que o aborto é uma prática corriqueira, feita em condições de higiene e segurança precárias, principalmente por quem não pode recorrer aos serviços particulares, que existem aos montes, mas que cobram caro para corromper a legislação.
Colocações como essas tendem a conduzir nossas convicções para o lado daqueles que são favoráveis à descriminalização do aborto, principalmente quando são apresentadas estatísticas sobre a quantidade de mulheres que foram esterilizadas, tiveram sequelas ou até mesmo tenham morrido vítimas de más condições na execução do aborto. Mas, de cara, detecto a existência de uma falácia nesse discurso. A lei existe e criminaliza justamente para salvaguardar direitos. E a lei entende que o feto possui direito de se desenvolver plenamente até o nascimento. Se não houver a criminalização, o que poderá ser feito para garantir que o aborto não seja praticado? É o mesmo que dizer: não sou favorável a que se roube, mas os roubos não serão mais punidos com a prisão, porque está provado que a maioria deles é praticado por pessoas que passam por algum tipo de necessidade, ou porque a sociedade relegou determinadas classes sociais a uma situação de exclusão. Quer?

A solução não me parece dar abertura à prática do aborto, mas, finalmente, dar educação sexual adequada aos nossos jovens e crianças. E isso implica em explicar a correta utilização de preservativos, pílulas e que-tais. Meninas e meninos precisam aprender sobre seus corpos, sobre as consequências e riscos da atividade sexual. Chegou a hora de derrubar definitivamente alguns mitos, no mais das vezes apoiados por convicções ético-religiosas, que devem defender suas posições sem impedir que a sociedade como um todo se instrua e saiba lidar com sua sexualidade.
Ademais, tenho duas opiniões sobre o que faz com que discutamos com veemência esse tema. O primeiro tem fundo moral e o segundo mais parece uma teoria da conspiração, mas vamos a eles.

Nossa sociedade tem praticado uma competitividade tão desenfreada que acaba caindo em uma série de armadilhas. O sucesso a qualquer preço, tão bem preconizado pela mídia para anunciar as benesses do liberalismo-capitalismo aos quatro cantos e aos quatro ventos, dá a nós a sensação de que a vida não pode ser considerada como algo que valeu a pena se não nos encaixamos aos seus ditames. Ora, o ser humano não é perfeito nem bem acabado. Tem seus limites, seus defeitos. Esse novo Deus, esse imperativo, dá como punição ao infiel a sua pressão, a sua depressão, suas síndromes do pânico. Homens e mulheres hoje desdizem de profissões que eram o máximo de respeito no passado, por conta de sua baixa rentabilidade. O homem sofre por não exercer suas vocações, e não sabe mais lidar com esse sofrimento. Os projetos para ter filhos são cada vez mais tardios. Primeiro, é preciso terminar a faculdade, para depois conseguir estabilidade na carreira, para depois buscar um casamento (ou não) e, aí sim, pensar em procriação. Um filho, neste meio tempo, é algo absolutamente indesejado, porque só vai atrapalhar, e muito, o desenvolvimento desses planos.
O ser humano não sabe mais sofrer. Só que o grande problema é que isso é inevitável. Então é preciso saber lidar com o sofrimento, saber ter as dificuldades, conviver com elas e superá-las. Eliminar o filho é a maneira fácil de contornar o problema, mas percebam como é uma atitude cruel, mesquinha. Vamos percorrer um itinerário filosófico para tentar entender o que é a atitude do homem perante o sofrimento.

Søren Kierkegaard foi um filósofo dinamarquês que praticamente inaugurou, de forma mais sistemática, o pensamento existencialista (evidentemente houve pensadores anteriores que trataram do tema, e posteriores, como Sartre, que o sistematizaram). Ele abominava as teorias de Hegel, que transformava os homens em conceitos, buscando universalidade em todos os aspectos. Kierkegaard reputava que essa atitude simplesmente tornava a humanidade em um mero objeto, esquecendo-se de algo primordial, que é a sua subjetividade, sua individualidade e, por extensão, de sua capacidade de livremente arbitrar e escolher.
Pois muito bem. Conceitos não decidem, não apontam para o absurdo. A tentativa de reduzir o ser humano a conceitos impede uma explicação razoável para atitudes que poderíamos reputar como insólitas. Escolher pelo menos esperado é uma das opções do homem, e suas causas não podem ser colocadas em uma prancheta, como quer Hegel. Ao contrário, a escolha determina tal estado de angústia que muitas vezes paralisa o ser decisório. O que torna as coisas ainda piores é o fato de que a própria omissão é uma escolha, e o homem se vê na trágica encruzilhada: não há como não tomar uma decisão.

Mas que tipo de decisões pode ter o homem? Isso vai depender do estágio de desenvolvimento humano em que se encontrar. Kierkegaard identifica três: o estético, o ético e o religioso. As mudanças entre eles se faz por um movimento dialético, que se dá através de suas atitudes diante das escolhas.
No homem estético, funciona primordialmente o princípio do prazer, do qual o nosso filósofo tem como arquétipo o personagem legendário espanhol conhecido como Don Juan. Esse camarada é o modelo máximo do hedonismo recursivo, do prazer que se alimenta até o paroxismo do próprio prazer. Don Juan encontra mais satisfação no jogo da sedução do que no próprio ato sexual. Este jogo é o campo onde ele emprega todas as suas astúcias, seus sentidos e sentimentos com o objetivo de fazer sua “vítima” ceder. Também esta última é movida pelo seu sensório: o conquistador derruba as barreiras uma por uma, até atingir sua meta, em um ciclo que, para a mulher desejada, representa uma possibilidade de experimentação de seus próprios limites. Para Don Juan, no entanto, as artimanhas da conquista representam o prazer em movimento, o desejo em ação, e a sua consumação tem um significado angustiante: a tarefa se cumpriu, o jogo acabou. Por esse motivo, o homem estético tem a característica da atividade incessante, que tem um objetivo que, na verdade, não deseja atingir. A busca pelo objetivo é a sua arte; sua obtenção é a sua tragédia. Disso redunda o desespero, o tédio e o inconformismo com o destino.

Já o homem ético é aquele que passa a saber lidar com deveres e limites. As frustrações do âmbito estético já o calejaram, e este homem passa a reconhecer uma largura delimitada em seu espaço de ação. Com isso, o homem ético busca relações estáveis, como o casamento – ele deixa de lado as aventuras de Don Juan, o homem que é escravo de sua insaciedade. A adequação aos ditames sociais leva o perfil ético a aceitar o escopo ambiental onde se insere, e ele começa a viver de acordo com regras, em um continuum, onde já não existe a pontualidade das relações ocasionais e o prazer não é mais o imperativo de sua conduta. Estas regras podem ser as leis, os mandamentos e tudo o mais que se dirija ao convívio entre os seres humanos. Em suma, o homem ético passa a conviver com a alteridade. Mas também aqui impera a angústia: seus braços estão amarrados, seu campo de ação significativamente reduzido. Ele procura intervir na sociedade com sua atitude bem pautada, mas esta não reage, e nosso pobre homem ético se vê colocado no vazio da existência, mais uma vez.
Agora, vamos falar sobre o passo à frente. Kierkegaard era um dos poucos filósofos que ainda levava a sério o Cristianismo após o advento do Iluminismo, e o fez de maneira inteligente, procurando extrair lições a partir das histórias de personagens bíblicos. O mais célebre exemplo, e que virá a calhar nesta nossa exposição, é o episódio do sacrifício de Isaac pelo seu pai Abraão. Para facilitar a compreensão, vou descrever rapidinho essa passagem. Quem já conhecê-la, pode saltar confortavelmente o parágrafo seguinte.

Abraão era um patriarca que foi o primeiro agregador dos judeus como um povo. Sua esposa, Sara, era estéril, e ambos já bastante idosos. Por sua fé, perseverança e fidelidade, Javé concedeu-lhe a graça de ter um filho, mesmo em sua condição desfavorável, a quem chamou de Isaac. O menino cresceu guapo e pimpão, lépido e faceiro, sagaz e perspicaz, até chegar à juventude, quando ajudava por demais seu velho pai no desempenho de suas necessárias tarefas. A vida transcorria com seus habituais porém contornáveis sobressaltos, até que se deu a tragédia: por intermédio de um anjo, Javé determinou a Abraão que oferecesse seu filho em sacrifício, como era corriqueiro fazer, à época, com cândidas ovelhinhas, trigueiros cabritinhos e voláteis pombinhas. Tomado de irrefutável tristeza, Abraão chama seu filho e inicia seu rumo ao monte dos sacrifícios. Chegando ao local, toma sua adaga ritual e posiciona o pobre mancebo para a imolação. No derradeiro momento, o mesmo anjo que havia trazido a má notícia determina a interrupção da ordem. A pantomima toda era destinada a experimentar a fidelidade de Abraão, e não levar a cabo a cruenta conclusão.
Bom... A que tipo de homem podemos atribuir a atitude de obediência de Abraão? Ao homem estético, que faz sua vida se assemelhar à arte, e para quem tudo é sensorial? Parece que sim, já que o homem estético vislumbra um sentido trágico na existência.

Mas não. Antes de mais nada, o homem estético é movido pelo imperativo do prazer, e o sentido trágico consiste exatamente na impossibilidade de atingi-lo permanentemente. A obtenção do desejo é sempre efêmera e seguida de um novo desejo e uma nova luta para alcançá-lo, em um ciclo sem fim. Só que no caso de Abraão não temos como falar em prazer, muito pelo contrário. Fosse Abraão um homem estético, só poderia pensar em algum prazer na continuidade da existência do filho, e não justamente em sua extinção.
Será um homem ético, portanto? Há indícios favoráveis. A atitude de Abraão é individual, mas já tomada com base em critérios que levam em conta a alteridade; afinal, parte de uma ordem externa (Javé) e são aplicáveis a uma outra pessoa (Isaac). A ele, cabe apenas o pior: tomar a decisão e executá-la.

Mas também não podemos atribuir a Abraão o perfil de homem ético, por um motivo bastante simples: o cumprimento da ordem implica na morte do outro, o que retira da ação todo o seu caráter moral, em especial por ser inaceitável pelas cadeias sociais.
Onde Kierkegaard enquadraria Abraão?

Para nosso caríssimo dinamarquês, o patriarca dirige sua ação guiado pelo objetivo maior, sem se importar com o prazer do homem estético nem com o regramento do homem ético. Abraão suprime o mundo ao seu redor e salta no escuro. Ele vai além, chega aonde um homem normal não chegaria, tudo em nome de uma meta que transgride e transcende o senso comum. Mas ele não o faz irracionalmente – procura conciliar subjetividade e absoluto, entende que apenas rumando à transcendência poderá se desamarrar do prazer inatingível (estético) e da estrutura sufocante (ético). Este é o homem religioso.
E o que isso tem a ver com a questão do aborto? Com a capacidade de sofrer em nome de um ideal maior, de algo que vá para além do simples alcance de nossa visão imediata.

Nossa sociedade tem tomado um rumo bastante interessante, que é o de lançar um olhar realmente mais sério para o outro, e a visão progressista tem procurado, aos poucos, dar direito real às minorias que, anteriormente, não tinham a possibilidade de viver plenamente a sua cidadania. E passam a lutar pela aprovação de leis que amparem esses direitos (se o ser humano fosse algo realmente benéfico ao planeta, não seriam necessárias as leis, já falei isso mais de uma vez. O bom senso seria o suficiente). É óbvio que isso implica sacrifícios e perdas de privilégios, mesmo que pequenos. Garantir terras aos indígenas significa limitar o alcance dos agricultores, dar vagas de estacionamento aos idosos representa a diminuição das vagas gerais, propiciar quotas universitárias aos negros reduz o quadro geral de vagas, fornecer acessibilidade aos deficientes aumenta o custo da construção de equipamentos públicos, dar aulas em LIBRAS para atender surdos força o professor a aprendê-la, conceder meia-entrada aos estudantes encarece o custo dos eventos, ampliar os direitos trabalhistas tem como consequência um menor índice de contratações, conceder direitos ao consumidor arrefece o leque de negociações possíveis com as empresas, proteger os animais reduz os orçamentos disponíveis para cuidar dos menores abandonados, impedir as crianças de trabalhar atinge o orçamento das famílias pobres e assim sucessivamente. Todos direitos bons e íntegros, aos quais dou meu total apoio e peço mais. Mas reconheço que os recursos não são infinitos e que o cobertor é bastante curto.
Se a sociedade tem essa disposição em garantir direitos ao outro, se está se encaminhando para assumir cada vez maiores sacrifícios, porque no final das contas é o único meio de estender essa possibilidade de plenitude cidadã; se essa sociedade luta pela garantia do direito à vida, de qualquer direito, por que quer retirar esse direito do feto e apenas dele? Como podemos determinar o que é uma vida que vale ou não a pena ser vivida? O sacrifício de Abraão tinha essa característica de fazer com que todo o benefício próprio e próximo fosse suprimido pelo objetivo maior. E se a vida é o nosso objetivo maior, de uma sociedade de ideias progressistas, devemos estar dispostos a encarar dificuldades. Será que estamos confundindo o outro com nós mesmos?

Não se trata aqui de fazer uma aplicação direta das ideias de Kierkegaard e desejar uma sociedade religiosa, não é isso. O que entendo é que precisamos reconhecer que as soluções mais fáceis, menos penosas, geralmente são mais imediatas, e isso nem sempre é o melhor, o mais humano, o mais respeitável ao outro. A liberdade tem limites, a individualidade também. Não existe direito de propriedade absoluto, como também não existe liberdade absoluta.
Agora, ser contrário ou favorável ao direito de abortar pode ser uma questão pessoal, mas o que eu acho extremamente desonesto é vincular automaticamente a posição anti-abortista aos grupos religiosos, especialmente por dois motivos:

1.   Procurei marcar minha posição no âmbito filosófico, e não religioso. A filosofia de Kierkegaard tem substrato religioso, mas pode ser estendida ao âmbito laico, e por isso a utilizei. É perfeitamente possível fazê-lo sem recorrer à religião e suas nuances morais;

2.   A posição das igrejas NÃO é inválida. Os defensores da impunidade do aborto costumam atribuir aos padres, pastores e guias espirituais (entre outros) uma visão obscurantista e retrógrada, limadora das individualidades e da liberdade. É bem verdade que o pseudo-moralismo de frases como “fez o filho, agora aguente” apenas mascaram o objetivo de reprimir a sexualidade, principalmente na forma de vingança contra a mulher. Mas quando tomam posições que buscam demonstrar que há uma vida a se defender, devo concordar com elas. Religiosos não são idiotas por definição. Podem até ser, mas não obrigatoriamente.
E aqui chegamos à teoria da conspiração. Na verdade, retomo algo que falei com relação à legalização das drogas, como consta desta página amarelada de meus alfarrábios.

O capitalismo vive de lucro e investimentos, baseado em um sistema de livre concorrência, que tende a se expandir até que uma situação de equilíbrio faz com que essa expansão se estabilize. Mas esse equilíbrio normalmente faz com que os ganhos sejam nivelados por baixo, já que uma nova ideia sempre é explorada até ser sugada ao seu máximo. Como tal, é um sistema em que é imprescindível que haja sempre a busca de novas fronteiras econômicas. Antigamente, a expansão do mercado se dava pari passu à expansão territorial, principiando-se pelo exaurimento dos recursos coloniais, e se seguindo pela constituição de sociedades economicamente estruturadas e preparadas para o consumo nos moldes capitalistas. Depois, as fronteiras a serem rompidas passaram a ser tecnológicas, e a produção de bens e serviços cada vez mais requintados foi substituindo a obsolescência. O diabo é que tecnologia custa caro e leva tempo a ser devidamente dominada. Há certas áreas mercadológicas em que se possui conhecimento técnico suficiente, há vasto mercado disponível e demanda reprimida bastante significativa, prontas para serem exploradas pela mecânica capitalista. E nesta seara encontramos produtos como drogas ilícitas, expansão agrícola em demarcações indígenas e... aborto! Vejam: é técnica simples, amplamente conhecida, rápida, que requer pouco tempo de internação, de baixíssimo risco, e que provavelmente terá o mesmo custo de um parto cesariano.
Uma pá de pesquisas já foi realizada pelos mais diferentes institutos e o brasileiro médio tem se mostrado contrário à descriminalização do aborto, mas essa desaprovação tem uma tendência de queda. Isso se deve, em boa parte, à ação da mídia. Vou dar um exemplo. Na péssima novela da globo (Amor à vida) que está sendo exibida atualmente (devo informar que já desisti dela – e que as novelas DEVEM ser analisadas, como fenômenos que atraem milhões de espectadores diariamente – observem as análises que fiz neste, neste e neste texto), houve uma cena que considerei nojenta. Diante do risco de vida de uma determinada mãe, um médico se recusa a realizar um aborto por “ferir suas convicções”, com uma cara de medo e estupidez de fazer pensar como um cretino daqueles conseguiu se formar médico. A impressão que se passa é essa mesmo, a de que as convicções morais, no mais das vezes de origem religiosa, são imbecilidades. Religiões impõem limites, e estes podem ser prejudiciais em certas relações. Olhem só.

Empresas médicas são anunciantes na mídia? Sim, são.
Empresas médicas vivem à base de lucro? Sim, vivem.

Empresas médicas precisam continuamente expandir seus negócios? Sim, precisam.
Empresas médicas gostariam de poder explorar ramos com tecnologia dominada, de baixo custo e amplo potencial de mercado? Sim, gostariam.

Empresas médicas poderiam considerar que o aborto legal se enquadra nas características acima? Sim, poderiam.
Empresas médicas cobrariam em um aborto o mesmo tanto que cobrariam em um parto (ou até mesmo mais)? Sim, cobrariam.

Significa? Para mim, sim. Mas posso estar enganado.

Recomendação de leitura:
KIERKEGAARD, Søren. Ou... Ou... Lisboa: Relógio d’água, 2013.