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segunda-feira, 29 de agosto de 2022

Navegações de cabotagem – a Casa do Figureiro de Taubaté e a inteligência existente no artesanato

(Uma peça de artesanato é como uma música - possui beleza única mesmo na multiplicidade. Mas isso não significa que a comparação seja boa sempre)

Olá!

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A urbe de Taubaté, onde mora minha menina mais nova, é uma das maiores da região paulista do Vale do Paraíba e guarda um bocado de tradições. É conhecida como a Capital da Literatura Infantil, e também é região de onde se irradiaram bandeirantes e tropeiros, muito próxima à Estrada Real, e que, por isso, guarda muitos elementos históricos e culturais. Talvez um dos mais significativos, daqueles que são quase sinônimos de uma localidade, bem menos heroicos e bem mais afetivos, são as figuras de barro cozido. Elas são típicas de muitas e muitas culturas, mas aqui temos uma produção sui generis. Para conhecê-la melhor, fui até a Casa do Figureiro. Vamos falar sobre ela.


O começo de tudo é obter boa dose de informação. E, para isso, a professora Erika Andrade contou a história do lugar e do surgimento da tradição dos figureiros de Taubaté. Tudo começa com o nome oficial: Maria da Conceição Frutuoso Barbosa. Ela é uma espécie de "padroeira" dos figureiros, por conta de um fato que transita entre o pioneirismo e a lenda.

Diz-se que ela, menina muito pobre e com um defeito congênito, costumava frequentar o convento franciscano da cidade, onde encontrou uma caixa contendo vários cacos de cerâmica, tão dispersos que era difícil identificar do que se tratava. Solicitou autorização ao frade que comandava o local para tentar reparar a imagem, o que fez. Ao terminar a árdua montagem, concluiu-se tratar de uma imagem da Imaculada Conceição, uma Nossa Senhora que flana coroada por entre os anjos.


Como a rua que concentrava a maior parte dos figureiros tinha o nome dessa santa, Maria Frutuoso entendeu se tratar de um chamado para erguer uma capela em sua reverência. A custo de muitas doações e trabalho voluntário, conseguiu erguer uma capela no começo da tal rua.


Tempos depois, em 1982, sobreveio uma tempestade de assustar Noé e a capela original veio abaixo, mas a imagem da Imaculada se manteve incólume.  Novamente movido pela sombra do milagre, o povo se mobiliza e a capela é reerguida, ampliada e remodelada, de forma a ser promovida para igreja, com o aspecto que sustenta até hoje, como pode ser observado na medíocre foto que eu tirei abaixo.


Respondida a questão do nome oficial, resta outra informação de cunho histórico: o porque do pavãozinho, e não do cabritinho, da vaquinha, do cachorrinho. Nos idos dos anos 70, foi lançado um concurso em nível estadual para determinar qual seria a melhor representação de todo o artesanato paulista. A vencedora foi Maria Cândida Alves Santos, que apresentou a peça de barro multicolorida e cunhada em relevo. Desde então, esse modelo de peça virou uma espécie de símbolo do artesanato do Vale.


Sua cor azul exuberante era obtida originalmente através de um pigmento para caiação de paredes, de um fabricante que ainda existe, mas não produz mais uma tonalidade que se assemelhe à original (azul ultramar). Hoje em dia, os figureiros precisam buscar tintas importadas para obter o mesmo efeito.


A técnica, originada das peças de presépio tipicamente franciscanas, tem uma receita básica que inclui a coleta de argila limpa, que aqui era feita no rio Itaim, e na moldagem manual, seja feita com as próprias mãos, seja utilizando-se estecas e espátulas.


Após moldadas, as peças vão para fornos semelhantes àqueles de Cunha, sendo que, para pequenas quantidades didáticas, a casa possui muflas elétricas, mas o ideal é que tudo seja cozido nos fornos de alta temperatura.


Os artigos são diversos, seguindo uma linha do dia-a-dia das coisas rurais. Os mais típicos são os Espíritos-Santos…


… as chuvas de pássaros…


… e a masterpiece, os pavões. Eles seguem sempre o mesmo padrão, mas que guardam em si a sutileza de cada artista: o rabo majestoso, o olhar lateral, a profusão de cores.


Essa variedade na pequenez dá uma sensação de semelhança muito forte, mas, para além do cuidado na confecção, há uma certa sensação de identificação em cada uma das peças, e a cada uma delas, nos sentimos mais apessoados, de maneira muito particular, e que às vezes não tem tudo a ver com a capacidade técnica, mas com nossa percepção.

Essa é uma maneira que temos de perceber a magia da arte. Detectamos o talento de uma forma meio espiritual, mas que possui explicações menos metafísicas e mais intuitivas.

É bem certo que haverá quem diga dos pavões: são todos iguais. Mas a percepção diferenciada também existe, e isso faz parte das características de cada um de nós, sem que ninguém possa se considerar melhor que o outro unicamente por conta disso. Há quem note melhor a direção de um vento, e isso não o faz deduzir lógica mais rápido; há quem perceba sutilezas nas fragrâncias das essências, mas isso não o torna um pé de valsa, e há quem saiba exatamente como vai reagir a uma piada, mas sem se tornar uma pessoa que dá bons ensinamentos. Somos bons em algumas coisas, piores em outras. Inclusive quando o aspecto diz respeito ao confronto entre mera opinião e percepção refinada. Falada a parte que diz respeito às aptidões, vamos ao tema, completamente correlato a tudo isso: musicalidade. É sobre isso que eu prometi falar no último texto, e é sobre isso que falarei hoje. Vamos lá.

Quando eu tinha minhas bandas de juventude, a principal marca era tatear no escuro. Todos éramos jovens, ainda incapazes de saber ao certo onde poderíamos chegar. Não me refiro às pretensões de estrelato, isso era comum a todos, mas em como a evolução no domínio das técnicas poderia nos levar a fazer música boa ou não. Alguns de nós chegamos a tocar realmente bem, enquanto outros perceberam que não davam muito para a coisa. Mas a questão maior surgia na hora de compor. Como todos nós queríamos, antes de mais nada, impressionar as menininhas, simplesmente papagaiávamos os maiores sucessos da última semana. Mas era uma forma de patinar, e, para ser levado a sério, era preciso criar. Colocar uma letra num papel já era coisa mais complexa, e saía algumas coisas dignas de vexame eterno. Se eu tenho músicas que faço questão de assinar embaixo, tenho outras cuja única vontade que tenho é de esquecer.

Isso tudo, no entanto, eram as dores do parto, e a definição de quem sairia vivo dessa aventura vinha com o traquejo dos dias, que, se não levou muita gente para uma carreira musical, pelo menos nos trouxe boas histórias para contar.

Lembro-me das vezes em que eu ia com uma de minhas bandas nas festas do Pio. Esse cara era um roqueirão que morava em uma casa perto do ponto final do Vila Ema, que tinha um grande quintal no fundo, onde seus pais ainda criavam galinhas. Quando os velhos saíam para viajar, ele juntava toda a galera musical que conhecia, e não eram poucos, porque o cara era uma daquelas pessoas que conheciam deus e o diabo na terra do sol, incluindo o Mosaico, a banda que me incluía. Lá vamos eu, Pena, Jaimolão e Edson tocar nossos progressivos sem teclado (mas com flauta), em uma festa que não continha orgias. Parecia mais um luau vitaminado com cerveja e ervas medicinais, onde todo mundo tocava um pouco, madrugada a fora, para aflição da vizinhança. Nessas miniaturas de Woodstock em meio às galinhas, acabávamos vendo gente que já conhecíamos, mas nem sabíamos que eram do meio. Refiro-me ao Ráfi, apelido fictício de um cara que eu nem sei se ainda é vivo.

Ele era protótipo de duas coisas: do burrão atrasado na escola, um repetente clássico que parecia aguardar o tempo certo do supletivo para se livrar da escola o mais rápido possível; e do contrabaixista - alto, magrelo, meio encurvado pelo peso do instrumento, discretíssimo e com os dentes meio proeminentes. Em um desses encontros, eu toquei com minha trupe uma boa dúzia de músicas, e íamos passando a vez para outros caras. Um deles era o tal Ráfi, a quem entreguei meu baixo, e o outro era um guitarrista bem mais conhecido, o Valcir, que já tinha passado por estúdios, o que já era muito para nós. Eles vieram só os dois, sem o restante da banda. Desisti da cerveja e passei para a bateria, perguntando o que íamos tocar. “Ah, vamos de improviso”, disse um deles. Eu fui no clichê: puxei um blues socado e meio ligeirinho, o ideal para quem quer ficar solando por algumas horas. Daí por diante, os dois meninos foram construindo suas melodias e perdi a noção do tempo que ficamos lá. Eu fui fazendo meu paninho de fundo sem virtuosidade, nem comprometimento, aproveitando para curtir os solos estilosos do guitarrista. Em um dado momento, meio que entrei numas… meu foco foi sendo puxado para a construção de baixo que o Ráfi estava fazendo. No final das contas, ele harmonizava tessituras muito mais sofisticadas que os próprios solos, e eu notei que era isso que me levava ao delírio, mais do que a atuação competente do guitarrista. Quem é baixista sabe da dificuldade que é manter uma base “cheia” sem que haja outra guitarra ou um teclado para dar cobertura, mas os desenhos sonoros do reputado burrão resolviam o problema com imensa vantagem. Tinha algo de funkeado em suas frases sonoras, com umas pitadas de jazz, de reggae, sei lá... e às vezes parecia que ia escorregar para fora do que tocávamos, mas logo ele dava a volta e eu podia perceber o que queria fazer. Eu nem acreditava que aquele pau de vassoura que eu chamava de contrabaixo conseguia extrair sons tão legais.

No fim, já todo suado, fui pegar o baixo de volta e perguntei a opinião do Ráfi sobre o instrumento. Ele disse, com seus dentes de abrir garrafa: “uma bosta, mas sempre dá prá se divertir”. Eu nunca deixei de  gostar de pessoas sinceras.

Isso demonstra, bem superficialmente, que a inteligência não tem uma direção só, e que ela vai muito além da habilidade técnica. Certo: as coisas saem melhor quando sabemos fazê-las, mas esse não é o distintivo da inteligência, mesmo que pareça o contrário.

O psicólogo Howard Gardner, observando esse fenômeno, deu origem à teoria das inteligências múltiplas. Segundo essa tese, exames quantitativos não são suficientes para se medir o tamanho da inteligência de uma pessoa, porque geralmente apenas o aspecto lógico-matemático é alcançado por ele. É uma definição muito controversa, amada pela galera da autoajuda, mas vista com desconfiança pela ciência. Mas estamos em um espaço da filosofia, e sob esse prisma as inteligências múltiplas não tem nada de errado, muito pelo contrário. Por isso, vamos prosseguir.

Nós sempre dizemos que fulano é inteligente e sicrano é burro com base nos meros parâmetros pessoais. Isso foge de qualquer pretensão científica, sabemos bem, servindo mais para atribuir méritos e deméritos com boa dose de maldade. No começo do século XX, a então proeminente psicologia entendia ser possível determinar uma mensuração objetiva para a inteligência, que oferecesse alternativa ao mero palpite de boteco. Diversos exames avaliativos foram criados, o mais famoso deles sendo o teste de QI, o quociente de inteligência. Este teste consiste em disponibilizar uma série de questões de múltipla escolha do tipo sequência lógica, em uma quantidade que permite extrair um índice. Há vários deles, inclusive espalhados pela internet. Os designativos "internacional", "exato", "confiável" ou "oficial" já denunciam que há algo de podre no reino da Dinamarca.

É que, embora a ideia de padronizar uma medida para a inteligência não seja ruim na essência, testes de QI são bastante contestáveis, especialmente porque, ainda que realmente medissem alguma coisa, seria a capacidade de raciocínio lógico, e o pensamento de Gardner é que esse é apenas um dos aspectos da inteligência. Melhor dizendo: a inteligência, sendo uma capacidade de absorver conhecimentos, não é unívoca. Ela não se dá em um só sentido, mas em múltiplos, sendo impossível existir um gênio absoluto que dê conta de todos, nem um jumento tal que não possua nenhum.

A psicometria pretendida pelos testes de QI se torna então muito difícil. É possível comparar quem tem melhor índices de resolução de contas, mas como fazê-lo entre tipos diferentes de inteligência? Gardner, a princípio, listou sete delas*, a quem vamos dar breve descrição:

Lógico-matemática - é a tal da inteligência do senso comum. Ela existe, de fato, e é expressa pela capacidade de fazer cognições bem resolvidas entre elementos que se relacionam entre si. Sua grande característica é a capacidade de traduzir o concreto em abstrato, o que, ao fim e ao cabo, vai desembocar em formulações, tão típicas da lógica formal e da matemática, daí o seu nome.

Linguística - representa o domínio da linguagem, ou seja, das formas de se comunicar pela fala, pela escrita, pelo gestual e pelas imagens. É a habilidade de traduzir os fatos e fenômenos em signos o mais indubitáveis possível, dar tradução exata em palavras para qualquer coisa que deva ser manifestada.

Intrapessoal - é a melhor definição da assertiva socrática: conhece-te a ti mesmo. É a habilidade de entender como são as próprias reações e de saber agir no momento certo, ousando quando precisa, sendo prudente quando é necessário.

Interpessoal – a capacidade de se relacionar com o outro, de se colocar em seu lugar, de conviver em comunidade, de compreender suas ações e reações e de solucionar conflitos o mais adequadamente possível.

Visual-espacial - um homem é um ponto no universo que se desloca pelo espaço disponível e interage com os demais corpos que residem no mesmo espaço. Aqui, o ser humano delineia cores, formas, distâncias, proporções e dimensões que compõem seu campo visual. A psicologia da Gestalt pode ser invocada para discutir vários dos fenômenos alcançados por essa inteligência.

Corporal-cinestésica - não basta ao homem existir no espaço, é preciso que ele interaja com ele. A inteligência corporal-cinestésica diz respeito ao controle sobre o próprio corpo, a maneira como ele se movimenta e como se trafega pelo "palco" de seu habitat.

Musical - aqui, nós vamos nos debruçar com um pouco mais de cuidado.

Inteligência musical, em uma análise rasa, significaria a parcela cognitiva que compreende a música. Mas… o que é música?

Em uma tentativa de definição o mais técnica possível, música é a disposição sonora harmônica através de um período de tempo. Quando dizemos isso, não falamos em qualquer tipo de som, mas de elementos que se costuram entre si de forma a desenharem uma linha coerente a que chamamos de melodia. A não ser na mão de malucos geniais como Hermeto Paschoal, um liquidificador ou uma furadeira não produzem sons harmoniosos o suficiente para serem considerados música. Além disso, há uma disposição que considera uma sincronização entre os diferentes ciclos, alternando momentos de maior e menor intensidade, o ritmo.  Tudo isso conjugado em equilíbrio de volumes, intensidades e timbres gera uma sequência harmônica a quem damos o nome de música, a arte das musas da antiga Grécia. Gostar ou não, é outro departamento.

O que seria a inteligência musical então? Observamos que não se trata meramente de um gostar de estímulos sonoros ordenados. Isso todo mundo gosta. A questão de ser inteligente musicalmente está mais atrelada à capacidade associativa que as camadas sonoro-musicais refletem do mesmo mundo onde elas existem. Afinal de contas, a música tem a característica particularíssima de ser uma ordenação em meio ao caos. Isso por que ela obedece sequências? Não, é claro, mas porque ela reúne e concilia elementos harmônicos entre si. Há música não somente nos sons, mas no corpo que dança ao seu sabor, e com isso interage com o mundo físico; há música na tonicidade e no ritmo da poesia, e com isso a integração com a linguagem; há música na modulação das vozes e, por consequência, na maneira como se dá as relações interpessoais. A inteligência musical não opera isoladamente, assim como nenhuma das demais inteligências. As proporções são diferentes, mas todos temos ao menos um pouco delas.

A inteligência não está vinculada à técnica, não confundam. Um cara pode esmerilhar seu instrumento e não sair disso – uma montanha de firulas, de viradas, de trejeitos e nada de produzir algo inovador, só um monte de notas acumulados umas em cima das outras. Arranjos megalomaníacos são jogados no chão quando colocados diante da verdadeira musicalidade, aquela inteligente, de quem compreendeu a necessidade de expressar ideias através dos sons, ainda que estes não sejam suportados por um poema. Às vezes a melhor solução sonora é a simplicidade, um baixo marcapasso, uma batida reta, uma voz única, um grito, quem sabe? Qualquer um que prestar atenção em um solo do David Gilmour sabe do que eu estou falando.

A musicalidade é outro nome para a tal inteligência musical. Ela não é privilégio de quem aprecia orquestras, mas de quem a possui, pronto. Não está vinculada à capacidade de executar músicas, mas de reconhecer todos os seus padrões e capacidade de expressão. Não gosto de falar em dom, porque parece uma coisa que alguém de fora dá à pessoa. Talvez de aptidão, que pode ser melhorada de acordo com o exercício, como fazemos com problemas matemáticos ou com treinos de academia. Mas é uma inteligência inerente, que pode estar muito mais presente nos repentistas da Praça da Sé do que nas imensas produções dos modernos sertanejos.

É isso. O grande problema do gênero é sua completa desvinculação com inteligência musical.

Uma das definições para inteligência é a capacidade de resolver problemas. Se o problema a ser resolvido não é definir como uma música pode ser melhor construída, mas como ela poderá vender mais, talvez a inteligência em uso não seja a musical.

Podemos falar que há mais inteligência lógico-matemática, para deduzir a capacidade de gerar lucro em uma música, ou a inteligência linguística para comunicar o que esse público específico quer ouvir e, principalmente, consumir, do que uma musicalidade que traga verdadeiro talento para os ouvidos. O bagaço é próprio da fruta – nem sempre temos coisas boas dentre as vendáveis.

O mesmo se aplica às pecinhas simples do artesanato taubateano. Há um ritmo nas cores, uma harmonia nas formas, uma melodia nas combinações

E por que há tanta gente que gosta desse tipo de música? Porque dizem para elas gostarem, e elas acreditam. Mas isso é tema para outro texto, porque este aqui já ficou imenso. Bons ventos a todos!

Recomendação de leitura:

Com o devido cuidado, é muito interessante a teoria de Gardner. Talvez careça de melhor verificabilidade na aplicação em sala de aula, mas me parece irrefutável que há algo de cognitivo naquilo que chamamos equivocadamente de dons, ou que haja apenas uma via para considerar alguém inteligente.

GARDNER, Howard. Estruturas da Mente. A Teoria das Inteligências Múltiplas. Porto Alegre: Artmed, 1994.


E tem a Casa do Figureiro, um dos destinos obrigatórios de Taubaté:

Casa do Figureiro
Rua dos Girassóis, nº 60
Campos Elíseos
Taubaté/SP
A aproximadamente 130km do centro de São Paulo

* O próprio Gardner ameaça reconhecer mais alguns tipos de inteligência, como a natural e a existencial. Só que a primeira nada mais parece do que um tipo especial da inteligência visual-espacial e a segunda é uma concessão a uma pretensa maneira de se lidar com a transcendência, para acomodar causas menos laicas, se é que me entendem.

sábado, 13 de agosto de 2022

O autoflagelo que vem do caminho diário e as cadeias de influência que permeiam toda a História

(Nossa vida é uma rede infinita de influências. Isso pode ser visto em ponto grande na própria história da Filosofia)

Olá!

Desde a aurora dos tempos, os hominídeos se diferenciaram dos demais animais pela sua capacidade de abstração. Houve um dado momento em que essa característica atingiu um nível de sofisticação tal que o homem começou a reconhecer que existia algo além dos seus sentidos, como se houvesse um "lado de lá". A cultura que deu substrato a estes seres reuniu os sentimentos de transcendência e os sistematizou, fazendo nascer as religiões. 

Como esse é um termo latino que significa religar, há que se supor uma desconexão, algum tipo de afastamento, e esse pode ser por inúmeros motivos, alguns indetectáveis. Para que se restabeleça a ordem das coisas, os fiéis oferecem alguma forma de sacrifício individual às suas divindades. Não obrigatoriamente na forma de rituais cruentos, mas através de imposições a si mesmos, que muitas vezes partem para o físico. São jejuns, reclusões e outras mortificações, chegando ao extremo das autoflagelações, quando se realizam punições contra o próprio corpo, pela expiação dos pecados próprios e/ou de outrem.

Parece uma prática perdida nesses rincões mais afastados do planetinha azul, mas há no seio do próprio Cristianismo quem cometa tal ato. É como nas confrarias penitentes dos católicos. Por ocasião da Semana Santa, eles laceram suas carnes com açoites especialmente produzidos para tanto, o que os faz ficar recobertos de sangue e com as costas completamente raladas.

Embora eu seja contrário a esses costumes extremos, a verdade é que eu mesmo, de tempos em tempos, pratico também meus autoflagelos. A coisa é toda mais ou menos assim: para quem não é habitué deste espaço, sou morador do centro de SP, a Terra da Garoa, a Capital da Vertigem, a Metrópole da Solidão. Vim morar neste lugar inóspito por cansaço de viajar todo santo dia dentro da própria cidade, e não me arrependo. Ocorre que, mesmo trabalhando na mesma Sé em que resido, ainda assim é preciso dar minha caminhada. De dia, o movimento é intenso, tanto do povo quanto das lojas. Em muitas delas, chegou-se à conclusão de que colocar música sertaneja é uma boa ideia para atrair clientes. Deve ser mesmo, porque o fenômeno se dá em sequência, e pela rua muita gente cantarola o maior sucesso da última semana ao lado das caixas acústicas sobrecarregadas.

A mim, é um suplício. Como as coisas não andam seguras e me foi expressamente contrarrecomendado o uso de fones, vou de ouvidos abertos, praguejando contra céus e infernos. Mas sou democrata e me coloco no lugar de vencido, sem estardalhaço.

Acontece que esse mesmo espírito fica cutucando minhas convicções e dizendo para eu deixar de ser preconceituoso. “Preste atenção no que eles dizem, não é possível que tanta gente os aprecie e que eles não tenham nada a dizer”, diz meu fantasminha interior, em claro apelo à maioria. E é o que eu faço, de tempos em tempos. Desprezo as melodias perturbadoras e vou observar as letras, porque pode ser que haja um desnível entre ambas, e, mesmo estando longe do campo acadêmico, podem ser muito boas em sua simplicidade, como tantas vezes já aconteceu na música popular. Asa Branca é a perfeita síntese do que sente o retirante que é obrigado a deixar terra e família, Romaria demonstra a fé do não-religioso, Iracema é a fala daquele que só tem a própria memória para resgatar o passado, como tantas outras pérolas que não foram lançadas em orquestras sinfônicas, mas nos bares, nas rodas de toada, nos alpendres das casas perdidas no interior.

Só que o resultado é sempiterno: de onde nada se espera, é de lá que nada vem mesmo. As letras não contêm a mesma simplicidade formal mencionada nos exemplos que eu dei, mas um vazio dentro do vácuo. Monotemáticas, com rimas pobres, estrutura repetitiva e profundidade zero. Musicalidade não há, como poderei descrever melhor em outro texto, que já estou escrevinhando. Há atrevimentos piores, como aproveitar melodias oriundas de outros estilos e adaptá-las ao universo em questão, gerando heresias como a transformação de The Sound of Silence, de Simon and Garfunkel, em É por Você que Eu Canto, de Leandro e Leonardo. Essa adaptação nem é das piores, mas meu precitado instinto democrático se esvai quando penso em monumentos da arte, que deveriam ser tratados como patrimônio histórico e artístico. A canção em tela é de um lirismo ímpar, um clamor em um mundo que se comunica sem se compreender, cuja leitura já se justifica por si mesma, sem a necessidade de estar musicada. E olha que muito de sua poesia se perde por conta da tradução. Músicas assim não poderiam ser vilipendiadas dessa forma… Bom, vou voltar para a casinha.

Meu autoflagelo se consuma ao depurar o tempo perdido na empreitada e no arrependimento certo, mas o fenômeno se repete, nem sei bem o porquê. A qualidade de nossa principal corrente musical é coisa para ser discutida, sim, mas em outro momento. Por ora, basta reconhecer que, evidentemente, minha ojeriza a esse tipo de música não brota de um campo que não tenha sido adubado com repulsividade. A culpada, como pude descrever neste texto, foi minha mãe, pobre dela, já morta e sendo-lhe imputado o pecado. Só que fazer uma leitura simples desse texto não vai esclarecer muita coisa, e dar impressão de ranço despropositado por parte da defunta genitora. Assim, cabe fazer um rápido detalhamento.

Como acontece inúmeras vezes nesta vida, minha mãe não teve um casamento feliz. Ela era o oposto mais perfeito possível do meu pai, até mesmo na questão de horários. Minha mãe era noturna, gostava de ir dormir tarde; meu pai era madrugadeiro, talvez educado por seus anos de roça. Ela era um ser eminentemente urbano, dançava e ia a cinemas e teatros; meu pai gostava das coisas mais do campo, como pescar e chupar laranja no pé. E ele bebia, bebia de dar gosto. O mais grave é que a personalidade dele melhorava quando bebia. Era casmurro quando sóbrio, e só se soltava após algumas doses. Então havia o delicado equilíbrio entre o momento exato entre o início do contentamento e chegada ao porre. Essa linha era facilmente saltada, e só se resolvia depois do sono, com a consequente ressaca e assim por diante.

Ora (direis), por que sua mãe aceitou esse estado de coisas? Por que não cortou o mal pela raiz, antes de se casar? Eu responderia que a divergência entre expectativa e realidade, tão comum na vida da gente, aplicou-se ao caso dela também. Sabe aquela história? Ele vai melhorar, ele vai se emendar, depois que nascem os filhos a vida muda e a conduta também. Não, não muda. Era um homem cinco anos mais velho, com profissão fixa, em um tempo onde isso era o bastante para dar a uma mulher da classe social da minha mãe seu destino inexorável: o matrimônio e filhos para cuidar. Não havia nada de frustrante na essência daqueles tempos, que tantos insistem em chamar de bons, mas ter um bom companheiro ainda era o mínimo que se esperava.

Com o tempo, a esperança se esvai e tudo o que eram pequenos defeitos, que seriam toleráveis, vão se tornando irritantes: a toalha de mesa usada como guardanapo, o monte de cavacos preso nas botas, o radinho de pilha ligado o domingo inteiro, a música que se ouve… Se minha mãe já não gostava do estilo, ela passou a odiá-lo, por lhe trazer na mente um distintivo da presença que já não lhe trazia mais prazer. Estou falando em um tempo, meninos e meninas, em que o divórcio ainda não era permitido, e quando isso passou a ser possível, causava uma péssima imagem às mulheres.

Eu-menino não tinha um discernimento apurado o suficiente para diferenciar as coisas, e fui sendo mais e mais influenciado a detestar um estilo que, se não era brilhante, ao menos ainda guardava alguma pureza. Mas dá-lhe Duduca e Dalvan, dá-lhe Mato Grosso e Matias, dá-lhe Milionário e Zé Rico, dá-lhe Irídio e Irineu, dá-lhe Trio Parada Dura. As coisas da terra não são mais cantadas, só aquela lenga-lenga pseudo-romântica, que foi se agravando com o tempo e desembocando exatamente no ponto onde se dá minha tortura pessoal hodierna.

Não se pode negar o poder que as influências exercem na vida da gente. Por vezes, elas são tão poderosas que acabam por determinar rumos históricos. Ou filosóficos. A ponto de se promover divisões profundas.

O episódio que eu gostaria de contar aqui diz respeito a Friedrich Hegel, um dos mais fundantes filósofos alemães. Seu pensamento é de enorme complexidade, e já abordei ele mais de uma vez no blog. Sua maneira de desenvolver os raciocínios fez com que uma conclusão bastante polêmica viesse à tona. Vamos passo a passo.

Já falei sobre a dialética em Hegel, neste texto. Para fins do nosso objetivo, vou repisá-la um pouco. Hegel entendia que o pensamento humano funcionava na mesmíssima chave de todo o restante da realidade. Entretanto, ao contrário do que poderíamos pensar intuitivamente, a realidade não se processa de maneira linear. Tudo o que existe está em movimento constante, e esse movimento se dá na direção de sua contradição. Em nossa vida, caminhamos para a morte, seu oposto. Acontece que, enquanto não se morre, se vive, ora essa. O que eu era há vinte anos ruma para o que eu serei daqui a vinte, e eu sou a síntese do que há entre o jovem e o velho: o homem de meia-idade. O melhor exemplo de todos é o da planta: uma semente se transforma em broto. Sendo broto, ela já não é mais semente. É, de certa forma, uma negação de si mesma. Depois de ser um broto, era vai virar flor, que já não é mais o broto, e depois vai virar fruto, que já não é mais a flor, até voltar a ser semente. Esse movimento da realidade é, no dizer de Hegel, dialético.

Transposta para o pensamento, a dialética começa por uma tese, que se opõe a uma antítese, e desemboca em uma nova ideia, já transformada pela afirmação e sua oposição, a síntese. Acontece que, como eu disse, Hegel compreendeu que esse processo de pensamento nada mais é do que um reflexo da realidade. Tudo está na História e tudo é História, inclusive a maneira como nossa consciência se projeta sobre as coisas e sobre os fatos. Eu dizia, em uma música minha, algo que era vergonhosamente óbvio, mas surpreendentemente hegeliano:

Se hoje somos o que somos

Foi porque fomos o que fomos

O bem ou o mal foi consumado

Na vida dos filhos do passado

É exatamente isso. Nosso presente é a síntese de toda a história, não só no desenrolar dos acontecimentos, mas na maneira como olhamos para eles. Coloque alguém que viveu a 3000 anos atrás diante de nossos livros de História, e sua percepção seria completamente diferente da que temos hoje. Isso porque sua razão não passou pelas transformações que foram se dando durante o intervalo de tempo que há entre nós e ele.

Esse estudo das contradições é, inclusive, uma maneira de se definir o melhor modo de estudar Filosofia. Quando eu ainda era um estudante da área, tinha em mim que lecionar de maneira cronológica era uma chatice, porque teria que seguir uma linha predeterminada, por onde teria que passar em conjuntos de ideias arcaicas, desinteressantes. Contudo, é somente estudando a Filosofia através de sua história que conseguimos decifrar seu estado atual. A ética de hoje é a síntese das diversas éticas corridas nos tempos. A metafísica de hoje é a síntese do que se pensou em metafísica no passado, e é uma nova tese, que sofrerá nova antítese, até chegar, no devir, a uma novíssima síntese.

Essa espiral que representa a realidade parece eterna, vai subindo, subindo, subindo sem ter um limite. Acontece que Hegel estabelece um fim para esse ciclo: a chegada ao Espírito Absoluto. Cabe aqui esclarecer que "espírito" na filosofia de Hegel não significa um sinônimo para alma, mas uma espécie de metáfora para a vivacidade do racional, que vive por dentro das mentes e que repete o mesmíssimo ritmo dialético de toda a realidade. O Espírito Absoluto se dá quando o confronto entre tese e antítese resulta sempre na mesma síntese, ou seja, a realidade ganha estabilidade. E aqui vem a polêmica.

Se todo o processo dialético se encerra na estabilidade do Espírito Absoluto, é de se supor que também os elementos culturais e sociais sigam a mesma lógica. Portanto, haverá um momento tal em que uma determinada sociedade encontrará uma situação estável, e não mudará mais. Hegel vivia na Prússia, no território onde hoje se situa a Alemanha, e uma boa parte de seus contemporâneos entendia, à luz das suas ideias, ter atingido a sociedade prussiana seu ápice.

Aqui nós vamos ter uma grande cisão entre os discípulos de Hegel. Ele foi um professor de grande popularidade em seu tempo - a quantidade de anotações de aulas feitas por seus discípulos comprova essa afirmação. Só que um sistema estruturado de maneira tão complexa não poderia levar a um entendimento unívoco, gerando algumas correntes que lhe são subsidiárias. Fundamentalmente, esta divisão se dá com aproximada reprodução dos sistemas parlamentares da Assembleia Francesa, ou seja, uma direita conservadora e uma esquerda revolucionária. Em síntese, a direita hegeliana entendia que o Estado prussiano já tinha atingido o auge da estrutura dialética e que não havia nada mais a se evoluir, enquanto a esquerda raciocinava que havia ainda escalada a acontecer, com aperfeiçoamentos sociais e políticos a ocorrerem.

Os conservadores vieram primeiro, e são apelidados de velhos hegelianos. O Estado prussiano, no entender destes, escalou todos os pontos possíveis das realizações políticas, econômicas e sociais, estando no máximo da espiral dialética. Sem dúvida que a influência cultural exercida pela religião luterana ajudava muito a se chegar a esta conclusão, porque, segundo eles, os aperfeiçoamentos do cristianismo original, que passou pela fase católica, chega em perfeita racionalidade ao Luteranismo, e todo ciclo de tese, antítese e síntese faria resultar novamente no mesmo Luteranismo.

Acontece que esta é uma clara visão de quem já detinha poder e privilégios. Qualquer um que não se beneficiasse da mesma situação conseguiria observar que havia muitas aparas, arestas e pontas soltas na sociedade prussiana para que a ascendente dialética não pudesse requerer novos confrontos. É com essa dimensão que surge uma onda concorrente aos conservadores, os assim chamados jovens hegelianos.

Mais do que uma discrepância política, os dois grupos se debatiam no seguinte ponto: até que ponto o Cristianismo (mais especificamente o Luteranismo) harmoniza-se com o sistema hegeliano? Essa pergunta nasce essencialmente da tríade de conteúdos que corporificam o Absoluto: a Arte, a Religião e a Filosofia. A Arte é a apreensão do sensível, e não entra no debate. Já a Religião expressa o conteúdo pela forma de representação e a Filosofia pelo conceito. Para Hegel, a Religião deveria transitar para a Filosofia, porque os conceitos são mais ligados ao Absoluto do que uma representação, principalmente porque o conceito é mais definitivo do que as diversas formas que podem ser manifestas pelas diferentes religiões. O que afirmava a direita hegeliana? Que a religião cristã já é ela, por si só, uma expressão de conceitos, sendo ela mesma Filosofia, e que, portanto, não está ainda submetida ao regime dialético, atingindo sua plenitude. Estão nessa escola Karl Göschel, Johann Erdmann e Kasimir Conradi, para citar três autores.

Óbvio que os jovens hegelianos riam às escâncaras dessa tentativa de imobilizar o curso histórico proposto por Hegel. Para demonstrar sua oposição, colocavam em xeque não o Luteranismo, mas seu próprio nascedouro: Jesus visto como ser divino. São todos autores interessantes a quem poderei voltar quando tiver os estudado melhor. Para David Strauss, a colocação de Cristo como a fusão do humano com o divino produz uma unidade sintetizada em um indivíduo específico. Todavia, para ele, isso não inviabiliza que a união entre finito (homem) e infinito (deus) na própria humanidade. A humanidade como um todo não peca: quem o faz é o indivíduo. Centrar a união homem-Deus em um único indivíduo vai fazer o conceito padecer do mesmo mal. Ele é, portanto, uma das representações possíveis, como havia definido Hegel.

Bruno Bauer faz uma crítica ainda mais pungente, duvidando até mesmo da historicidade do ser humano Jesus. Ele nos diz que, apesar de todas as narrativas contando milagres e ensinamentos, nada há de prova para a existência de um filho de carpinteiro que confrontava as sinagogas, a não ser a representação de uma forma de pensar do povo, em clara antecipação a Ludwig Feuerbach. Ele diz ainda que a religião é um ato de profundo egoísmo, atribuindo destino salvífico a indivíduos, e menosprezando a realização humana como objetivação do mundo.

Max Stirner aprofunda a noção baueriana de egoísmo religioso. Ele entende que, quando criança, um indivíduo se apega ao real concreto, por não ter ainda suficiente capacidade abstrata, portanto apresentar um deus para ela significa fazer comparações com entidades concretas, como o pai ou o rei. Ao se tornar jovem, já aí consegue lançar mão de abstrações, de modo a transformar o concreto em conceito. E é aí que ocorre de se lançar adoração a um conceito: do que é bom, do que é justo, do que é generoso. O jovem pensa adorar a uma divindade, mas adora a um conceito, ou um conjunto deles. Este conceito, então, se transmuda em uma relação de poder, sempre vindo da transcendência em direção ao indivíduo, e nunca o contrário. É quando o jovem passa a crer de fato, a ter uma religião. Ele nota, no entanto, que invocar o conceito deus também lhe traz algum poder, só que sobre outros indivíduos: deus te castigará, deus te abençoe. Estas imprecações estão ao alcance do indivíduo, e são ferramentas para ele. Entretanto, ao chegar à idade adulta, o indivíduo percebe que o conceito nada mais é que uma palavra, uma invenção humana, que serve essencialmente para concretizar os seus desejos, e que ele mesmo usa para autoconforto, para exercício do poder. O conceito nada mais é do que uma palavra emancipada, que ganhou significado para além do seu próprio alcance. O universo do indivíduo, nesse sentido, encerra-se em si mesmo - nem deus, nem a humanidade é algo a se crer e ser idealizado. O homem se guia pelo egoísmo absoluto.

Notem como nenhum desses jovens hegelianos, embora concordem com a historicidade da razão e com o passo dialético da realidade, tem pensamento compatível com a ideia de uma sociedade prussiana em plenitude, especialmente no alinhamento da religião cristã luterana com a filosofia conceitual de Hegel, como queria a ala direita. Deles saiu uma cadeia de influências que foi parar em Marx, que foi parar no Existencialismo, na Escola de Frankfurt, em Zizek, e tanta gente mais, até os dias de hoje, sem contar tanta Filosofia que brotou exatamente para contrapô-lo. E mesmo Hegel trouxe a noção de devir de Heráclito, de continência da substância no ato e potência de Aristóteles, na oposição à razão apriorística de Kant e tantas outras influências.

Nós somos nossas influências, mesmo que seja um velho ressentimento materno. Bons ventos a todos!

Recomendação de leitura:

Hegel não é nada fácil, mas não podemos nos furtar da tentativa. Pegue um bom manual, tome informações esquemáticas e parta para a tentativa. O livro abaixo é um bom começo.

HEGEL, Friedrich. Ciência da Lógica. Petrópolis: Vozes, 2018.