Clique aqui para ler mais textos sobre meus bate-e-volta
Meus bons amigos (onde estão?), com este texto estou dando início a uma nova série. Ao contrário do que acontece com meus relatos de viagem*, que têm escopos fechados, este conjunto será permanentemente aberto, com acréscimos ocorrendo de acordo com seus fatos geradores. E o que lhes comporão?
Meus bons amigos (onde estão?), com este texto estou dando início a uma nova série. Ao contrário do que acontece com meus relatos de viagem*, que têm escopos fechados, este conjunto será permanentemente aberto, com acréscimos ocorrendo de acordo com seus fatos geradores. E o que lhes comporão?
Sabem aquelas viagens de um dia, os famosos bate-e-volta, em
que nós só temos tempo de ir a um lugar específico? Tipo assim: vou até Santos,
mas Santos tem muita coisa para se ver – o mar, os museus, o orquidário, o
bonde, o porto, as igrejas, os prédios tortos, a catraia, os quiosques. Mas
digamos que eu tenha ido apenas à Vila Belmiro, para assistir Santos X Alguém,
contentando, dessa forma, a peixeira patroa. Lá estando, tenho a recorrente
epifania filosófica, e, neste caso, o que devo fazer? Segurar o ímpeto e o
tema, a espera de fazer um itinerário completo pela cidade? Não, nada disso. É
para tanto que servirá esta série – Navegações de Cabotagem. Já explico o nome.
Minhas impressões de viagem sempre foram seriadas com
alegorias marítimas, com uma única honrosa exceção. Geralmente, quando pensamos
em navegações, temos em mente os longos dias que se passam em alto-mar, onde há
momentos em que tudo o que se vê é água para todo lado, a ponto de ser
indistinguível o que é céu e o que é oceano na linha do horizonte. Mas existe
outra modalidade de tráfego náutico, onde não é necessário se afastar tanto da
costa. É a cabotagem, em que a embarcação se mantém a uma distância em que é
possível ter o litoral visível. Ao contrário do que li por aí, o termo
“cabotagem” não diz respeito à navegação entre dois cabos (projeções de terra
mar adentro), mas ao modo como o navegador e cosmógrafo veneziano Sebastiano
Caboto fazia suas explorações ao longo da costa da América. Sem pressa, Caboto
palmilhava légua a légua a linha litorânea das terras ainda incertas, de modo a
conseguir informações muito mais precisas e menos arriscadas. Desta forma, cada
etapa de suas expedições era substancialmente mais curta do que as navegações
de longo curso realizadas entre pontos distantes.
As minhas navegações de cabotagem, portanto, são aquelas em
que eu não vou muito longe. Resumidamente, no fim destes dias, eu durmo em casa
mesmo. Satisfeitas as burocracias introdutórias, vamos entrar de cabeça em um
rápido périplo que realizei ainda no ano passado, quando fui até a cidade de
Cabreúva para conhecer o magnífico templo Kadampa.
Fui para lá unindo o útil ao agradável. Meu filho mais velho
foi prestar um concurso público na cidade, e enquanto ele desfiava seu
conhecimento em meio à geral dos causídicos, fui esticar os músculos na região
central da cidade. Apesar de se tratar de local quase pertencente à metrópole,
Cabreúva é rigorosamente típica estada interiorana, onde pouca coisa abre aos
domingos, e a igreja matriz de Nossa Senhora da Piedade...
... e o coreto da praça Comendador Martins dão o exato ar de
cidadezinha tão conhecido nestas minhas rodagens: as paredes de taipa, o estilo
colonial de outrora, o sol queimando a calma quase imóvel das tardes.
Em Cabreúva, cujo nome vem da árvore homônima, também se
preserva um bom conteúdo histórico nas pequenas edificações espalhadas pelo
centro urbano, que ladeiam praças para o repouso e o namoro, com seus bancos e
chafarizes, como a praça Alberto Mesquita de Camargo, onde tirei um cochilo dopopranzo no colo da consorte, coisa de
quinze minutos.
Isso se deu depois que a fome bateu e fomos atrás da caça.
Achamos um restaurante de comida mineira bem próximo à matriz com qualidade
bastante satisfatória e decoração agradável, como esta cozinheira que sustenta
os folhetos de apresentação da casa, com respectivas promoções.
Logo mais, aproveitando a boa fama dos doces desta área,
fomos atrás da sua loja mais célebre, o Empório Uai, à beira da Estrada dos
Romeiros, que liga ao Santuário de Bom Jesus de Pirapora, em Pirapora do Bom
Jesus (parece trava-línguas).
A propaganda é gratuita, porque os produtos são bons, apesar
de caros para um dedéu. Tem queijos e outras iguarias também, e costuma estar
cheia de ciclistas que se aventuram pelas serras que guarnecem a região.
Como ninguém é de ferro, as redondezas das Serras do Japi e
do Taguá tem ainda uma boa quantidade de alambiques, embora menos que dantes,
um dos quais de parentes já distantes deste escriba, em Santana de Parnaíba.
Essa garrafa dá uma certa dimensão da dubiedade entre custos e benefícios da
ardente água.
Mas vamos ao que interessa. Do meio para o final da tarde,
quando ainda faltava um bom tempo para a prova do primogênito acabar, fomos
conhecer o Centro de Meditação Kadampa, um templo budista que parecia uma
pintura nas fotos que eu havia visto até então. Ele é intitulado de Templo pela
Paz Mundial.
O templo fica no entremeio dos morros do bairro do Jacaré,
já em meio rural. Um dos convites é a própria contemplação do meio natural, que
favorece à meditação tão cara a esta escola religiosa, como veremos daqui a
pouco. É um lugar muito silencioso (a não ser o burburinho dos transeuntes).
O espaço conta com lanchonete e alojamentos, mas é dentro do
templo que está o que é de mais significativo e belo, ao mesmo tempo. Passado o
pórtico principal, destaca-se o amplo salão onde há cadeiras e esteiras, para
quem prefere se sentar na posição de lótus. Houve um tempo em que eu conseguia
ficar horas assim. Hoje, a ferrugem dos joelhos me permite, quando muito, meia
hora. Ao fundo, um altar e uma espécie de púlpito, de onde os monges proferem
suas palestras. Se existe uma diferença fundamental entre as prédicas dos
budistas e dos pregadores cristãos, está no tom de voz.
Sendo um santuário budista, é natural que muito da arte
estatuária esteja vinculada à imagem de Buda. Algumas das obras maiores fazem
remissão ao Buda “original”, Sidarta Gautama, ou Buda Shakyamuni; outras dizem
respeito a monges que atingiram o mesmo nível espiritual. Escolhi a foto abaixo
porque ela mostra não só um destes budas, mas, no reflexo, é possível ver
também a dimensão interior do teto e o sistema de iluminação feito por janelas.
O fundo e as laterais do templo são complementados por obras
de arte que são compostas por estátuas de budas masculinos e femininos
(confesso minha ignorância em não saber que elas existiam), pinturas e outros
adereços.
Como o Budismo preconiza uma prática de abandono de
materialidade, é bastante comum que se façam oferendas às entidades. Segundo os
monges, a oferenda é muito mais para quem oferece do que para quem é oferecido.
Ou seja, é uma ação concreta da virtude da doação. Essas oferendas que estavam
no interior do templo são um pequeno detalhe do cuidado que se tem com a
representação do rito.
Outro ponto importante é a obrigatoriedade dos pés descalços
no interior do espaço sagrado. Muitas religiões, inclusive o Judaísmo e o
Cristianismo, consideram os pés como a parte mais suja do corpo. No Budismo,
isso é ainda mais enfático. Sapatos recolhem toda a sujeira que há no chão, e
isso torna desnecessário que se limpem os pés antes de adentrar à nave. Simples
e fácil. É só colocar os calçados ao lado dos outros tantos que ficam na porta
de entrada.
Por fim, há, em uma espécie de móvel assemelhado a uma
cristaleira, algo que parece a réplica de um grande templo que, na verdade, é
chamado de Mandala de Heruka, uma representação tridimensional de um objeto
tântrico, que é o palácio de uma divindade meditacional. Diante dela, são
recitados mantras de modo parecido ao que os católicos fazem com o rosário. Um mala é uma série de contas que ajuda a
manter o controle das orações feitas diante da mandala**.
Vou contar uma rápida historinha. Quando eu era menino de
uns oito ou nove anos, morava em frente da minha casa uma família de operários
muito pobre, cujo filho homem era um dos meninos da rua, com quem jogávamos
bola e corríamos atrás de pipas. Como sua condição econômica era a mesma de
todos nós, não havia grandes protocolos em entrar e sair uns das casas dos
outros. O nome do garoto era César e seu pai era o seo Arnaldo, constantemente desemprego por via da vista ruim,
agravada pela bebedeira habitual. Acontece que, dos males o menor, a casa em
que eles moravam era própria, o que representava um certo alívio nas agruras.
Pior era a situação do tio do César, o Moacir, este sim sem um gato para puxar
pelo rabo, e com a mesma inconstância empregatícia do irmão. Frequentemente a
história se repetia: o sofá da sala estendido à guisa de cama para abrigar o
parente despejado das moradas de onde o locador lhe punha para correr. Em uma
dessas idas e vindas, ele trouxe com a limitada bagagem um móvel esquisito,
semelhante a um oratório, que cheirava forte a incenso e que possuía um sininho
em forma de cálice aos pés de uma imagem de um homem gordinho. Para a pergunta
inevitável (o que é isso?), a resposta singela:
- Melhor você mesmo ver.
E é o que fiz. Na manhã do dia seguinte, ficamos eu e o
César fingindo bobeira no quintal, bem de frente à janela da sala, e dava para
ver perfeitamente o desenrolar dos acontecimentos. O fato é que o oratório
estava virado para fora, o que deixava nosso investigado Moacir de costas para
o vitrô, o que facilitou as coisas. Na hora do culto, ele acendeu os incensos,
abriu as portas do oratório e murmurou palavras irreprodutíveis, enquanto
golpeava o sininho, de quando em quando. Este foi o meu primeiríssimo contato
com o Budismo, de uma forma pouco aclaradora e ainda com o inconveniente viés
de ironia da infância.
Fato é que o Budismo é bastante complexo, muito mais do que
as meras pancadinhas em uma sineta podem fazer supor, e significativamente mais
próximo da Filosofia do que ocorre com outras Religiões. Isso por vários
motivos, e vamos investigar alguns.
O primeiro fato notável é que o pensamento budista prescinde
da existência de um Deus. Temos a tendência de achar que Buda é como Javé,
Tupã, Allah ou outra divindade pessoal, mas não. Primeiramente, Buda não é um
só – é qualquer um que atingiu a iluminação e saiu do ciclo de nascimento e
morte. Segundo que Buda não tem superpoderes como os deuses, que criam e
destroem de acordo com seus critérios e vontades. A formação do credo budista
se dá através do mesmo mecanismo usado por Tales para lançar as bases da
Filosofia ocidental – a observação do universo e a aplicação da lógica. Da
mesma forma que Tales parte da premissa de que há água em todos os cantos e
emanando de todos os corpos para originar sua teoria
da arché, Sidarta Gautama, o Buda primordial, observa a natureza cíclica ao
seu redor para concluir que todo o tempo é circular da mesma forma. Se o dia
renasce, as estações do ano renascem, as fases da lua renascem, as marés
renascem, a vida também renasce. Isso é o que se chama de samsara, o fluxo interminável de nascimento e morte, do qual fazem
parte todos os seres sencientes. Mas esse eterno ciclo não significa que
seremos sempre os mesmos. De acordo com o nosso conjunto de ações e intenções,
ou o nosso karma, o renascimento se
dará de diferentes formas. Atos ruins podem levar um homem a ressurgir como um
inseto, um fantasma ou um demônio***. Ao contrário, boas práticas fazem o homem
evoluir para espíritos elevados, que podem, por sua vez, degenerar novamente em
homem, em animal e assim sucessivamente. Ou seguir evoluindo até a budeidade, ou
seja, virar um Buda.
As conclusões do princípio de ciclo permanente partem da
experiência de Sidarta Gautama, que viveu lá pelo século VI a. C. no norte da
Índia. Era um príncipe do clã Shakya, e, como tal, gozou dos privilégios de sua
condição: riquezas, banquetes, palácios, mulherada, blá-blá-blá. Mas havia uma
inabandonável insatisfação a lhe perturbar o espírito. Foi conhecer o mundo
para além das fronteiras de seu reino, e por toda parte, fosse exposto
diretamente, fosse maquiado sob uma casca que lhe disfarçasse, encontrou o
sofrimento. Encontrou respostas para suas angústias através de profunda
meditação, e não de revelação divina, o que mais uma vez o aproxima da
Filosofia. Esse insight ficou
conhecido como Iluminação, e é por isso que Sidarta recebeu o cognome de Buda, o Iluminado em idioma Pali.
Quais foram as conclusões que Buda chegou em sua iluminação?
O samsara é formado por ciclos com um substrato de sofrimento. Os mais óbvios
deles são a dor física causada pelas doenças e a dor psicológica levada a
efeito pelas perdas, mas há sofreres muito mais sutis, que estão presentes o
tempo todo de nossas vidas. É a impaciência na fila do banco, a preguiça de ir
para a rua em dia chuvoso (está chovendo enquanto escrevo), a reclamação do
salário pouco, a inveja do vestido da vizinha, o ciúme do elogio ao colega, a
indisposição com o mendigo que nos pede, a raiva com a derrota no clássico, a
impotência quando o moleque nos xinga, e, principalmente, uma sensação de que
tudo poderia ser melhor do que aquilo que temos de fato. O sofrimento existe no
atacado e no varejo, em tudo o que fazemos. Essa é a primeira premissa
fundamental do eixo filosófico budista: o dukkha,
o sofrimento permanente.
O Budismo, como já dissemos, não possui um deus
interveniente. Sua lógica está na continuidade, e não na excepcionalidade. Tudo
o que ocorre é um encadeamento de causas e consequências, que são mediadas
pelas condições e circunstâncias. Portanto, algo que fuja de uma linha vem de
um desequilíbrio nessas condições, e não pela intervenção divina. As coisas não
dão certo ou errado porque deus quer, mas porque tem coisa fora de seu lugar.
Alguma coisa foi feita para que efeito “x” ou “y” tenha se desencadeado. É por
isso que budistas não acreditam em milagres. Havendo essa relação de
causalidade, é de se esperar que o sofrimento seja a causa das aflições
humanas, mas ele mesmo é uma consequência, não brota de árvores. E tudo o que
nos faz sofrer vem do desejo. Claro que não podemos vincular a dor física ao
desejo; a não ser que tenhamos um desvio sadomasoquista, ninguém quer sentir
dor, apenas que a dor cesse. Mas é o desejo irrealizável quem nos fustiga
diariamente. Não adianta concretizar o pequeno desejo. Há um desnível entre o
sonhado e o conseguido, entre o esperado e o real. Pior ainda – por mais que
tenhamos a realização de um desejo, ele se soergue novamente à nossa frente no
segundo seguinte. Compramos a moto, queremos o carro; compramos o carro,
queremos a casa; compramos a casa, queremos a mansão. E assim sucessivamente,
para sempre, inexoravelmente, com cada um arrancando mais forças de nós. O
desejo é o causador do sofrimento, e esta é a segunda premissa do Budismo, o samudaya.
Até agora só falamos de constatações, mas é hora de partir
para uma inferência lógica. Buda concluiu que o sofrimento é a causa das
inquietações humanas, e que este, por sua vez, decorre da insaciabilidade dos
desejos. Ora, sabemos que os desejos estão vinculados ao samsara, na medida em
que seu giro interminável está ligado ao fato de que a realização dos desejos
está vinculada à vida material. A solução para a questão do sofrimento é se
libertar do samsara, atingindo o nirvana,
a imperturbação diante da extinção dos desejos e superação do apego aos
sentidos. Esse terceiro axioma é o nirodha,
a extinção do sofrimento pela superação dos desejos.
Por fim, não basta entendermos causas, condições e
consequências. É preciso saber como agir para atingir o nirvana e sair do
samsara. Segundo Buda, é preciso saber trilhar o caminho do meio, nem tão
apegado à carne que não seja possível se desligar dos desejos, nem tão ascético
que te faça tentar sair do mundo estando ainda nele. Esse é o tapete por onde a
doutrina budista pisa: a moderação e a serenidade. E a técnica para tal é o
chamado Nobre Caminho Óctuplo, aplicações práticas na vida da pessoa, onde se
encerra a metafísica budista e se inicia a sua ética, e que consistem em
entendimento correto, pensamento correto, fala correta, ação correta, meio de
vida correto, esforço correto, atenção correta e concentração correta. Esse é o
magga, o caminho para o fim do
sofrimento.
Reconhecer o sofrimento, entender a sua origem, compreender
a maneira como deve ser extinto e saber qual o caminho a trilhar para fazê-lo
são as Quatro Nobres Verdades, a raiz
da medula do pensamento budista, e são autossuficientes, dentro desse sistema,
para não necessitar de um deus. Seria, então, o Budismo uma doutrina ateia?
Seria até mesmo uma não-religião?
Para a segunda pergunta a resposta é fácil. Sim, é uma
religião porque, além dos aspectos éticos e doutrinários, o Budismo é
fortemente ritualizado, e possui um sistema de regras bastante bem consolidado.
Vejam que há divisões no Budismo, sendo o Kadampa uma subvertente
ocidentalizada da corrente Mahayana, mas, se comparado com o Cristianismo, e
mais especificamente ao Protestantismo, o Budismo tem uma unidade muito maior,
inclusive com o reconhecimento mútuo do valor de suas correntes****.
Para a primeira, é preciso tentar compreender bem o que é
ser ateu. Grosso modo, ateu é aquele
que não acredita em uma divindade, e nesse sentido estrito o Budismo seria
ateu. Mas se pensarmos em um ateu como alguém destituído de crença, nesse caso
não podemos encaixar os budistas no panteão dos céticos absolutos. O primeiro
problema está no fato de que os budistas não dizem que deus não existe, apenas
silenciam sobre o tema. E, mais importante, os budistas creem numa
transcendência. O ciclo de vidas não é algo detectável através da experiência,
ao menos do ponto de vista científico. Ao dizer que tudo o que morre renasce,
Buda não faz uma afirmação de cunho imanente, materialista. Isto é indetectável
por nossos instrumentos.
O ateísmo no sentido clássico é plenamente materialista,
algo do que o Budismo é tremendamente distante. Seria melhor pensar em um agnosticismo,
porque assumir um deus absoluto implica em uma quantidade imensa de
contradições no âmbito metafísico, e o seu objetivo, mais do que fazer uma
rendição de culto a uma suposta divindade superior é, como vimos, indicar um
caminho mais adequado de vida. Chamar um budista de ateu é simplesmente não
compreender que sua doutrina aponta para outro rumo. Mas mesmo isso é delicado
de fazer, já que o budista não é um descrente: ele acredita na validade dos
ensinamentos de Buda, na sua própria presença no samsara, na maneira como o
karma lhe direcionará os novos nascimentos, e qual é a estratégia que deve
seguir para atingir seu objetivo espiritual. Um ateu na acepção da palavra, e
mesmo um agnóstico, não dão valor a este tipo de prática.
Eu sugiro: conheça o Budismo, muito mais do que vocês
puderam ler neste texto. Não se trata de proselitismo, por dois motivos – não
sou budista e o budismo não é apostólico. Vejam como uma religião pode dar bons
conselhos sem soluções ad hoc,
difíceis de entender e de engolir. Conheça também os templos, são o suprassumo da arquitetura oriental. Conheça-o como Filosofia. Já estou preparado para conhecer outros templos, e
retomar o tema aqui. Bons ventos a todos!
Recomendações:
Minhas observações sobre o Budismo são vergonhosamente
rudimentares, e trouxe-as aqui pelo bem do olhar filosófico. Recomendo alguma
literatura introdutória sobre o assunto, como este livro que adquiri exatamente
neste dia, de autoria de um dos principais monges ainda vivos da corrente
Kadampa.
KELSANG, Gyatso (Geshe). Introdução
ao Budismo. Uma explicação do estilo de vida budista. São Paulo: Tharpa
Brasil, 2017.
E, o que é ainda mais essencial, recomendo a visita ao
templo, belíssimo e de facílimo acesso, na cidade de Cabreúva, a 77 Km de São
Paulo. Recomendo um pouco de paciência e, ao invés de ir pelo caminho mais
rápido, vá pelo caminho mais belo, saindo da Rodovia Castelo Branco em Barueri
e seguindo até o Templo pela Estrada dos Romeiros, passando por toda a região
serrana. Em uma tarde de domingo, para os fins de meditação, o próprio caminho
já é um preparo.
* Para quem quiser conhecê-los, seguem os links das páginas
de índice:
** Talvez tenhamos um pouco de dificuldade de compreender
corretamente o que é uma mandala em nossa cultura ocidental, pelo simples fato
de que entendemos o tempo como uma sucessão de eventos em linha reta. As formas
circulares de uma mandala dão a noção de um tempo cíclico, com sucessivos
inícios e términos. Por isso, quando você for a uma casa de artesanato e ver
uma destas, entenda que não se trata de um mero bibelô, mas um objeto ritual
com um significado bem definido.
*** Lembrando que a concepção de demônio no Budismo é
completamente diferente do Cristianismo. São seres que caminham para o lado
exatamente oposto do caminho da iluminação, que se apegam mais e mais aos seus
desejos.
**** Tradicionalmente, o Budismo tem duas grandes correntes,
theravada e mahayana. Seu principal ponto de divergência diz respeito à questão
dos bodhisattvas, seres que já
estariam aptos a sair do samsara, mas que optam em permanecer nele para ajudar
outros seres em sua busca pela iluminação. Para a corrente theravada, a
iluminação é uma conquista individual, por isso os aspectos monásticos são
muito evidenciados, e os bodhisattvas não são necessários. Já o mahayana
entende ser desnecessária uma vida monacal, e para isto os bodhisattvas são
importantes, como propugnadores dos ensinamentos de Buda a um público mais
próximo da laicidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário